quarta-feira, 1 de maio de 2013


Juristas discutem liberdade automática ao fim da pena


Criada para apresentar ao Senado um anteprojeto de reforma da Lei de Execução Penal, uma comissão especial de juristas avalia a extinção do sistema de alvará de soltura. Segundo uma das propostas que pode ser incorporada ao projeto, o condenado deverá ter conhecimento prévio, assim que começar a cumprir a pena, da data certa de sua soltura. Deixaria de ser necessário, assim, o alvará de soltura do juiz de execução para que o réu seja posto em liberdade ao cumprir a pena.
Sidnei Beneti, STJ - 30/04/13 [Divulgação]O ministro Sidnei Beneti, do Superior Tribunal de Justiça e presidente da comissão, é um dos defensores da medida, apontada como solução para o problema da pena vencida. Beneti sugeriu a criação de um sistema de registro central que deverá interligar os estabelecimentos penais para facilitar o controle da soltura. No dia final, o próprio diretor do estabelecimento deverá assegurar a liberdade ao detento, sob pena de responder por abuso de autoridade se ultrapassar o prazo.
"O problema da pena vencida é uma verdadeira chaga nacional", disse o ministro, que considera a soltura do condenado ao fim da pena um direito sagrado. No início de abril, já no primeiro encontro de trabalho depois da instalação do colegiado, os integrantes apresentaram sugestões de pontos para discussão. Duas novas reuniões foram marcadas, para os dias 10 e 26 de maio, que poderão ser também transformadas em audiências. Ficou ainda acertado que o ministro Beneti vai acumular a presidência e a relatoria da comissão.
Beneti afirmou que pedirá a renovação do prazo de funcionamento da comissão. As reuniões ocorrerão preferencialmente em Brasília, mas o ministro estimulou os outros cinco membros a disseminarem discussões pelo país, por meio de audiências regionais.
SuperlotaçãoUma preocupação geral se relaciona ao problema da superlotação e da precariedade dos presídios. O promotor de Justiça de Pernambuco Marcellus Ugiette sugeriu que a nova lei defina parâmetros para evitar situação verificada em seu estado, onde uma unidade com capacidade para 98 presos abriga cerca de 1,5 mil. Ele sugeriu a criação de um pequeno percentual de tolerância em relação ao limite técnico da unidade. Quando atingido esse limite, seria taxativamente proibido admitir o ingresso de qualquer outro preso na unidade.
“Precisamos tirar o Estado da zona de conforto e chegaremos a isso se conseguirmos que ninguém mais possa entrar no presídio depois de atingido o teto de capacidade”, disse Ugietti.
Depois de mencionar as condições “medievais” dos presídios, o advogado Carlos Pessoa Aquino defendeu verbas obrigatórias para o sistema prisional e de execução penal como um todo. O presidente da Agência Goiana do Sistema de Execução Penal, Edemundo Dias, criticou as retenções de verbas e desvios de finalidade. Contra isso, ele defendeu o orçamento impositivo para a área, embora considerando que a Lei de Execução pode não ser o lugar certo para esse tipo de mecanismo. Informou que, no dia anterior, havia tomado conhecimento de que cerca de R$ 13 bilhões destinados ao sistema prisional no Orçamento estavam retidos.
Segundo projeções apresentadas por Maria Tereza Uille Gomes, secretária de Justiça, Cidadania e Direitos Humanos do Paraná, cresceram os temores sobre o futuro do sistema prisional brasileiro. Também presidente do Conselho Nacional de Secretários de Justiça e de Administração Penitenciária, ela mostrou tendências para o crescimento de vagas, em comparação com o número de presos no país, que possui a quarta maior população carcerária do mundo.
Atualmente, para quase 550 mil presos, existem pouco mais de 309 mil vagas nos presídios, o que revela um déficit de 43,7%. Levando em conta a tendência estatística, Maria Tereza afirmou que o número de presos pode chegar a mais de 1 milhão até 2023, enquanto até lá as vagas serão pouco mais de 338 mil, quando o percentual do déficit chegaria a 68,77%. Superar o problema exigiria um aumento da oferta de vagas em 220%, com impacto financeiro estimado em R$ 22 bilhões, considerando um custo médio de R$ 30 mil por vaga.
De acordo com Maria Tereza, a pressão carcerária vem principalmente da condenação por tráfico de entorpecentes, depois furtos e roubos. Homicídios simples e qualificados estariam na sexta posição. A seu ver, os números estão indicando a necessidade de soluções menos encarceradoras, que devem ser reservadas para crimes mais graves. “Furto e receptação não são tão graves e continuam gerando superlotação, além de despesa elevada”, afirmou.
Praticidade e eficiênciaO presidente da comissão assinalou que o sentido geral da reforma da Lei de Execuções Penais — a Lei 7.210/1984 — deve ser a “praticidade e a eficiência”. Em sua opinião, deve-se atingir dois objetivos: a prevenção individualizada quanto ao transgressor, para que não volte a cometer infrações; e a prevenção geral, para infundir o sentimento de que a prática delituosa acarreta punições.
Entre outros pontos a serem analisados pela comissão, o ministro Beneti sugeriu ainda a necessidade de fixação de medida máxima de tempo para a prisão preventiva. Porém, o tema é da esfera do Código Penal. Por isso, essa e outras sugestões podem ser encaminhadas para a comissão de senadores que examina a reforma desse código, a partir de anteprojeto elaborado por outro grupo de juristas.
Penas alternativasEmbora esteja no Código Penal a definição sobre o preso que terá direito a penas alternativas, cabe à Lei de Execução Penal definir como elas podem ser cumpridas. Quanto a esse ponto, Sidnei Beneti pediu aos colegas ideias para a criação de um rol de medidas alternativas, pois entende ser necessário algum grau de padronização. A prestação de serviços, se muito longa, a seu ver, pode criar “má vontade” e problemas operacionais, tanto para o condenado quanto para as instituições que devem ser por ele atendidas, muitas vezes resultando em “comparecimento fictício”. “Vamos tentar fazer uma lista de medidas que, dentro do possível, seja de fácil aplicação.”
A questão do trabalho dentro das prisões também foi citada para exame, com sugestão, por parte de Edmundo Dias, para que o trabalho seja obrigatório, na medida da aptidão e da capacidade do preso, inclusive o provisório. O promotor Ugiette observou que, em Pernambuco, o governo proibiu o trabalho de presidiários se não houver salário. O objetivo é impedir futuras ações trabalhistas, resultando numa queda elevada de presos que hoje estãos em qualquer atividade. A seu ver, a nova lei deve enfrentar essa questão de forma equilibrada.
Saídas temporáriasUgiette também defendeu o exame de novas regras para as saídas temporárias. Ele acredita que a melhor forma é diluir as saídas, para que o preso possa deixar a prisão mais vezes, mas por tempo mais curto. A seu ver, o fato de o preso ficar por muito tempo na prisão faz com que, ao sair em situação temporária, se encontre sob maior pressão, o que contribui para o mau comportamento.
Para Carlos Aquino, a nova lei deve ainda definir prazos de prescrição para as faltas disciplinares, sugerindo que o teto seja de dois anos desde a imputação. Em relação ao direito de visita, o advogado citou a importância de que seja assegurado ao preso o direito de receber visita do companheiro, independentemente de orientação sexual ou qualquer outro aspecto.
fonte: Agência do Senado.

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